Profissionais de saúde concordam: há que trabalhar em rede para empoderar as mulheres
VIII Colóquio de Enfermagem em Saúde Materna e Obstétrica do Centro Hospitalar de Leiria
Falando de parentalidade feliz, no VIII Colóquio de Enfermagem em Saúde Materna e Obstétrica do Centro Hospitalar de Leiria (CHL), os profissionais de saúde concordam: há que trabalhar em conjunto, em rede, médicos obstetras, enfermeiros, pediatras, do hospital e do centro de saúde, para criar mais confiança nas famílias e empoderar as mulheres. O Colóquio decorreu nos dias 14 e 15 de abril, e reuniu mais de uma centena de profissionais para debater a Saúde da Mulher ao longo de toda a vida.
Helder Roque, presidente do Conselho de Administração, destacou a importância destes encontros como «oportunidades de formação e de atualização de competências, que permitem tornar-nos mais competitivos, mais aptos a responder a novas solicitações». O responsável destacou ainda «o potencial, o talento, o valor, o comprometimento, inovação, criatividade e empreendedorismo dos colaboradores do CHL, que são quem ajuda a marcar a diferença na saúde dos nossos utentes».
O papel do enfermeiro especialista no acompanhamento das gravidezes de baixo risco foi tema das intervenções de Silvia Prazeres, enfermeira especialista em Saúde Materna e Obstetrícia no CHL, e Sónia Barbosa da Rocha, enfermeira especialista em Saúde Materna e Obstétrica, em aconselhamento e acompanhamento personalizado na gravidez, parto, pós-parto e amamentação.
Para Sílvia Prazeres, a vigilância da gravidez de baixo risco pelos enfermeiros especialistas é uma necessidade para garantir uma população mais saudável desde o início do ciclo de vida, que explicou o Programa da DGS para a vigilância da gravidez de baixo risco, que reconhece a importância do enfermeiro especialista no acompanhamento destas grávidas. Para esta profissional, o enfermeiro é o elo de ligação com as grávidas e as famílias, transmitindo confiança e contribuindo para dar competências às famílias, no que toca a medos, dúvidas, angustias, etc.
«Temos muitas grávidas que ainda recorrem à urgência obstétrica apenas para saber se está tudo bem com o bebé, porque não tiveram possibilidade de ter consulta com o seu médico assistente. Se o enfermeiro especialista pudesse fazer a vigilância da gravidez de baixo risco ou normal, que já prevista no plano nacional da DGS, efetuar exames, poderia ajudar a dar resposta às solicitações, que nos cuidados primários ainda não é possível dar», refere Sílvia Prazeres.
Para mudar o mundo, vamos mudar a forma de nascer
Esta é a opinião partilhada por Sónia Barbosa da Rocha, que trabalha como parteira independente. Apresentando o midwifery model of care, Sónia defendeu que o nascimento se tornou um evento médico, com excessiva medicalização, e, falando da sua experiência, explicou como o enfermeiro se torna no profissional de referência para a grávida, contribuindo para mais saúde materna e familiar. «O enfermeiro é o pilar para acompanhar esta mudança», defendeu, e deixou o desafio: «para mudar o mundo, fica o desafio, vamos mudar a forma de nascer».
Ana Perdigão, jurista no Instituto do Apoio à Criança, e Fernanda Santos, médica de formação específica de Ginecologia/Obstetrícia no CHL, falaram sobre a contraceção na adolescência, e Maria Carlota Cavazza, médica de formação específica de Ginecologia/Obstetrícia no CHL, abordou os métodos de monitorização fetal intraparto.
«A essência do cuidar no pós-parto – fazer muito em pouco tempo» foi o tema da apresentação de Sofia Pereira, médica de formação específica de Ginecologia/Obstetrícia no CHL, e Zita Santos, enfermeira especialista em Saúde Materna e Obstétrica no CHL. As profissionais abordaram os procedimentos das equipas que acompanham o bebé e a mãe no pós-parto, desde o acolhimento no Serviço, o envolvimento do pai, o despiste de eventuais complicações tanto na puérpera como no recém-nascido, educação para a saúde, primeiro banho, vacinação e rastreio auditivo do bebé, etc. É ainda dado apoio à amamentação, e é incentivado o papel do pai como suporte na continuação da aleitação ao peito. No dia da alta, o casal é instruído para sinais de alarme no bebé e na puérpera, e são dados ensinamentos sobre como transportar o bebé no carro. Nas 24 horas após a alta, a equipa de enfermagem do Serviço contacta a mãe através da linha de apoio Buáaa, que está também disponível para o pais, sempre que precisarem.
Margarida Agostinho, assistente graduada do Serviço de Pediatria, e Andreia Marques, enfermeira do Serviço de Obstetrícia, apresentaram o projeto “Criar-te em segurança – bebés, crianças e jovens em segurança”. Integrado no Programa Nacional de Prevenção de Acidentes, visa melhorar o nível de literacia em segurança rodoviária infantil, e a adoção de comportamentos seguros pelas grávidas, pais e famílias, no transporte do bebé no automóvel, desde o momento da alta hospitalar e ao longo de toda a infância e juventude. Seguiu-se um workshop, com a demonstração prática de instalação de sistemas de retenção de crianças.
“Um passo para a parentalidade feliz” foi o mote do primeiro painel do segundo dia do encontro. João Agro, assistente graduado do Serviço de Pediatria, abordou a avaliação da eficácia da amamentação após a alta, momento no qual têm de ser, entre outros, despistados eventuais transtornos na mãe e no bebé. Carlos Mascarenhas, enfermeiro especialista em Saúde Materna e Obstétrica no Hospital de Viseu, e conselheiro da UNICEF, defendeu a exclusividade do aleitamento materno até aos seis meses, direito consagrado na Declaração dos Direitos da Criança e na Declaração de Innocenti. Mascarenhas defendeu uma maior articulação entre profissionais e prestadores de cuidados, «só com a complementaridade de todos contribuímos para ser o quinto país do mundo que trata melhor as crianças».
Mascarenhas relevou o processo de consciencialização e de empoderamento e apoio à mulher, que são capacitadas para o aleitamento materno: «Há que dar maior confiança à mulher, este é o ponto-chave». Para o profissional, há que «informar, compreender, confiar e apoiar» e não descriminar, «não fazer juízos de valor, que causam stresse e inibem a amamentação».
Inês Santos, engenheira biomédica, partilhou as suas vivências da amamentação na primeira pessoa, destacando o apoio dos profissionais de saúde, do hospital e do centro de saúde, para a manutenção do aleitamento ao peito, que ainda mantém, após 16 meses. Inês Santos destacou ainda empresas com boas-práticas nesta área, que são condições às suas colaboradoras para manter a amamentação depois de retornarem ao trabalho.
A amamentação é ortodontia preventiva
Teresa Vale, odontopediatra, abordou os hábitos de sucção não nutritivos, e a influência da amamentação. Para esta especialista, os profissionais de saúde materna e pediatras fazem «verdadeira prevenção ortodôntica», porque, ao estimularem a amamentação, previnem hábitos de sucção não nutritivos na chupeta e no dedo. «O hábito de sucção surge porque é um prazer, as crianças relembram momentos tranquilos, mas leva a alterações ósseas com repercussões graves. A chave para os problemas oclusais é a amamentação que previne hábitos de sucção inadequados. Um bebé amamentado à mama exercita a sucção corretamente - que é uma necessidade e é normal - e por isso a amamentação é uma medida preventiva de hábitos de sucção não nutritivos e problemas da cavidade oral, além disso o leite materno é o alimento menos cariogénico que existe».
Bilhota Xavier, diretor do Serviço de Pediatria, relembrou que é necessário respeitar a individualidade de cada bebé, e concordou que «todos temos um papel muito importante para uma família equilibrada, com ou sem amamentação». Constança Cordeiro Ferreira, terapeuta de bebés, falou dos bons inícios e das atitudes dos profissionais que favorecem o sono de bebés e pais. Para ela, os verdadeiros especialistas nos bebés são os seus pais, mas há que capacitar os pais, dar-lhes apoio porque, no fundo, os profissionais são «o colo que ajuda os pais a entenderem-se com os bebés».
A gestação do bebé humano não termina quando nasce, o seu habitat natural é a mãe
Para Constança Cordeiro Ferreira é essencial dar mais suporte paterno e familiar à mãe, que ainda continua muito sozinha no pós-parto. Falando dos high need babies (bebés de alta demanda), que levam muitos pais a procurá-la, «os que choram sem parar», a terapeuta explica que este comportamento não é mais que o bebé a procurar os padrões que conhece, que viveu no útero materno, e por isso há uma demanda de mama e de colo – o alimento, calor e embalo/ritmo constante que tinha no útero.
Para Constança Cordeiro Ferreira, estamos a querer transformar os nossos bebés “carry” [transportar], que devem andar sempre com a mãe, em bebés “cache” [esconderijo], que vêm equipados para estar longas horas sozinhas, como no caso dos ratos. «A gestação do bebé humano não termina quando nasce, o seu habitat natural é a mãe, pelo que não faz sentido dizer às mães “se está a dormir coloca-o no berço, que fica viciado em colo”». A terapeuta terminou a sua intervenção defendendo a intuição das mães e dos pais no cuidar do bebé, mesmo nas questões mais controversas, como por exemplo se se deve colocar o bebé a dormir com os pais: «Não há decisões certas nem erradas, desde que sejam seguras, o que importa é diminuir o stresse, a ansiedade e o medo dos pais».
Os desafios da mulher ao longo do ciclo vital foi o tema do painel que terminou o encontro. Arminda Anes, docente na Escola Superior de Enfermagem da Universidade do Minho, falou do papel do enfermeiro na adaptação da mulher à menopausa, e nas estratégias para alcançar o bem-estar nesta nova fase da vida, e Teresa Paiva, médica neurologista especialista em medicina do sono, explicou como saber dormir é a chave para saber viver.
Leiria, 20 de abril de 2016
Leiria, 20 de abril de 2016
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